O Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC) está há 140 dias sob intervenção. São quase cinco meses desde que o reitor-interventor André Dala Possa tomou posse da instituição a mando do governo federal sem ter sido eleito. O drama poderia ter encerrado nesta terça-feira (8) se a 3ª turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) aceitasse o pedido de agravo feito pela assessoria jurídica do reitor eleito Maurício Gariba Júnior. O pedido, porém, foi negado.
O pedido argumentava que seria possível dar posse ao reitor escolhido pela comunidade até que o processo judicial fosse analisado em seu mérito, ou seja, antes da necessidade de ouvir testemunhas ou produzir provas dentro do processo.
Para a equipe eleita, já existia elementos para que os desembargadores analisassem a situação de intervenção e determinassem a posse imediata, mesmo que em caráter provisório, da equipe eleita, até que seja analisado o mérito da ação.
Com o pedido negado pelo TRF4, a equipe eleita informou que irá recorrer e levar o debate para o Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Mesmo sem o resultado favorável no julgamento desta terça-feira, Gariba aponta que ainda não houve oportunidade de julgar o mérito da questão.
“Ainda não tivemos, em nenhuma instância, a oportunidade de provarmos que o Ministério da Educação está equivocado em nomear um reitor pro tempore. Isso vai ocorrer assim que o mérito da ação for analisado, o que esperamos que ocorra o mais breve possível”, afirma Gariba.
Além do julgamento do mérito, outro caminho para dar fim ao período de intervenção no IFSC é a conclusão do Processo Administrativo Disciplinar (PAD), que está em andamento junto à Controladoria Geral da União (CGU).
Reitor eleito Maurício Gariba Júnior. Foto: Paulo Henrique Porto Amorim.
No Processo já foram ouvidas todas as testemunhas de defesa e de acusação, o que indica que em breve a CGU deverá chegar a uma conclusão.
“Acompanhamos todos os testemunhos e ficou evidente, no PAD, que estamos sendo acusados sem qualquer base ou comprovação”, afirma Gariba.
Na base do golpe
Em dezembro de 2019, André Dala Possa concorreu ao posto de reitor do Instituto Federal de Santa Catarina. André perdeu a eleição mas foi nomeado ao cargo em maio deste ano. Para barrar a transição do reitor eleito e se manter no cargo, o interventor usa de manobras antidemocráticas que contrariam até mesmo decisões do próprio Conselho Superior da instituição.
Indicado pelo Ministério da Educação (MEC) para o cargo de reitor pro tempore (temporário) do IFSC, André não apenas têm barrado a transição da reitoria eleita, como suas ações acabam atravancando as discussões sobre o funcionamento do instituto durante a pandemia.
A comunidade do Instituto, porém, tem confrontado o reitor-interventor.
Desde o começo da intervenção, conselheiros do Conselho Superior (Consup) têm disputado pela manutenção da transição do reitor eleito. Fora dos órgãos de representação, a comunidade também tem agido. Desde que André tomou posse, no dia 4 de maio, a comunidade acadêmica do IFSC têm se manifestado em repúdio à ação do MEC.
Em diversos campi do IFSC os alunos ergueram cartazes e faixas contra a nomeação. Uma ação virtual também foi realizada pelos estudantes. Um buzinaço próximo a reitoria também ocorreu como forma de repúdio à intervenção.
Faixas e cartazes são pendurados nos compi do IFSC. Foto: Reprodução da internet.
Ações na justiça
Além da ação judicial movida pelo próprio professor Maurício Gariba Júnior e sua equipe, também tramitam na justiça federal dois outros processos que pedem a posse imediata do reitor eleito e o fim do período de intervenção do MEC no IFSC.
Uma é movida pela União Brasileira de Estudantes Secundaristas (Ubes), que tramita em São Paulo. O outro processo é de autoria do Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica (Sinasefe) Seção Sindical IFSC.
Todas aguardam a apreciação do mérito em suas respectivas instâncias.
Em agosto, a Ordem dos Advogados do Brasil de Santa Catarina (OAB/SC) emitiu um parecer favorável à posse do professor Gariba para o cargo de reitor do IFSC, apontando que o processo de intervenção do MEC no IFSC viola diversos direitos constitucionais.
“O fundamento da decisão da Presidência da República em sobrestar o processo de consulta (eleição) finalizado (…) é violador dos direitos fundamentais da presunção de inocência, da garantia do devido processo legal, consubstanciado no direito ao contraditório e à ampla defesa do professor Maurício Gariba Júnior, e do direito à representatividade política da comunidade acadêmica”, afirma a OBS/SC, em documento.
Histórico
A comunidade do IFSC escolheu Gariba como reitor, no segundo turno, por 36,29% dos votos contra 26,08% do candidato André. Mas o MEC não nomeou o professor Gariba alegando que ele respondia a um processo administrativo no âmbito da Controladoria Geral da União (CGU).
Em abril, quando encerrou o período da gestão anterior, o então Ministro da Educação, Abraham Weintraub, nomeou Lucas Dominghini, professor do Câmpus Criciúma. Lucas, que sequer participou do processo eleitoral, abdicou da indicação por entender que o processo de escolha foi legítimo e democrático. Em seguida, o ministro então nomeou André, que não apenas aceitou o cargo, como tem feito de tudo para permanecer na cadeira de reitor.
Mesmo com o processo, Gariba continua apto a assumir o posto de reitor, de acordo com a legislação que orienta as eleições nos Institutos Federais e conforme os editais que nortearam o processo eleitoral. Para a equipe eleita, ocorre uma perseguição ideológica.
“O MEC usou essas duas “desculpas” (MP 914 e processo na CGU) como muletas para inviabilizar a posse, quando na verdade o que ocorre é uma perseguição ideológica, já que o prof. Gariba e sua equipe têm histórico de atuação sindical e de luta por ampliação de direitos dos trabalhadores da educação”, afirma a equipe do reitor eleito.
A lista tríplice é um instrumento antidemocrático que pendura na atual Constituição. Com ela, o governo federal pode simplesmente ir contra a decisão da comunidade universitária e nomear um interventor, tal como se fazia no período da ditadura empresarial-militar.