Revolta pelo assassinato de Guilherme de 15 anos, morto por PMs
Manifestantes foram as ruas na periferia de São Paulo em protesto pelo assassinato de Guilherme
Por José Braga, redação do Universidade à Esquerda
19 de junho, 2020 Atualizado: 13:07
Uma revolta tomou as ruas de Vila Clara na periferia da cidade de São Paulo nos dias 15 e 16 de junho. Moradores e apoiadores protestaram contra a violência policial e por justiça pelo assassinato de Guilherme da Silva Guedes. O estudante de 15 anos foi sequestrado, torturado e morto por policiais militares.
O assassinato de Guilherme
Guilherme foi sequestrado por volta de 01:30 de domingo (14/06) em frente a casa de sua avó, quando dois homens armados o levaram. A filmagem de uma câmera de segurança da rua identificou um dos homens que sequestraram o menino: o sargento da polícia militar (PM) Adriano Fernandes integrante do batalhão de ações especiais da polícia (BAEP). No local do sequestro foi encontrado também um pedaço de uma farda com a identificação “SD PM Paulo”.
Ele foi encontrado morto na manhã de domingo na cidade de Diadema. Seu corpo revelou sinais de tortura. Familiares relataram que ele sofreu uma violência brutal que deixou marcas em seu corpo, com marcas de tiros na cabeça, no rosto e na mão dentre outros ferimentos pelo corpo. Contam que só puderam reconhecer Guilherme por conta das tatuagens que grafavam em seu peito os nomes dos pais.
Seus parentes contam que Guilherme era um menino tranquilo e afetuoso, tinha muitos amigos no bairro. Sua prima contou a mídia que ele era tímido, gostava muito cachorros e sonhava em ser piloto de avião. Guilherme trabalhava com sua mãe, Joice, lhe ajudando a vender marmitas. Era apegado a sua avó, e na noite de seu desaparecimento tinha a acompanhado de volta à sua casa.
Guilherme da Silva Guedes, 15 anos Foto: Reprodução
A avó, Antônia, relatou em reportagem a Ponte que soube que na noite do sequestro de Guilherme algumas crianças entraram num galpão da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo – (Sabesp) que fica próximo a sua casa. Ela conta que as crianças costumam entrar no galpão para ter acesso a um espaço de um mercado próximo no qual deixam comida vencida. As crianças correndo dos seguranças do galpão teriam passado por Guilherme e avisado para ele correr, ao que ele teria se recusado: “Eu não devo”.
A segurança do galpão é feita por uma empresa de propriedade do PM Adriano Fernandes, a “Campos Forte Portarias Ltda.”. A Ponte apurou que Adriano está na polícia desde 1993 e tem 6 homicídios em sua trajetória. Adriano recebeu homenagens do coronel Alvaro Camilo, secretário executivo da PM e naquele momento deputado estadual.
O PM está preso temporariamente. A investigação segue apurando quem seria o outro homem que aparece nas filmagens.
Revolta
Moradores de Vila Clara e apoiadores foram as ruas em revolta pelo assassinato de Guilherme. Protestos e atos de solidariedade e memória tem acontecido desde segunda-feira (15/06). Joice, mãe do estudante entre a dor e a raiva diz: “eu quero justiça, e eu não vou parar, enquanto não vier a justiça eu não vou parar!”.
Na noite do dia 15 os moradores e apoiadores protestaram clamando por justiça e pelo fim da violência policial. Uma avenida foi fechada pelos manifestantes e ônibus foram queimados. A policia militar respondeu com grande repressão. A Rede de Proteção e Resistência Contra o Genocídio denunciou a tentativa da PM de reprimir os atos, com forte presença da tropa de choque e abordagens violentas a moradores ao longo da noite.
No dia 16 mais atos aconteceram no bairro. Os manifestantes foram novamente as ruas gritando por justiça para Guilherme, pelo fim do genocídio da juventude negra, contra a polícia militar e denunciando o Estado no assassinato.
Houve também muita emoção em memória de Guilherme. Sua avó carregava um cartaz com os dizeres: “Obrigado por fazer parte de nossas vidas”. Os manifestantes cantaram a música “Valeu, menor” em sua homenagem: “Que mundo é esse tão cruel que a gente vive? A covardia superando a pureza; O inimigo usa forças que oprimem, oprimem; É, vai na paz, irmão, fica com Deus; Eu sei que um dia eu vou te encontrar; Valeu menor, espera eu chegar”
Seu tio, Amorim, conta que a polícia não dá trégua aos jovens. Nas ruas do bairro os policiais atacam: “O negócio deles é jogar bomba, é bater na molecada […] chegam batendo, dizendo que é maloqueiro e vagabundo […] só sabem escrachar o pobre, o pobre, o rico não”. Danielle, que foi sua professora de Artes fala indignada: “Não eduquei menino pra ser morto pela polícia”.
Nos dias seguintes continuaram os atos em memória de Guilherme e em solidariedade a seus familiares. Guilherme não será esquecido. As lutas contra a violência policial e o racismo tem explodido no mundo e no Brasil, denunciando que o assassinato de Guilherme não foi um caso isolado, como não o foram o de João Vitor, de Evaldo, de Cláudia e Amarildo, de George Floyd. Elas denunciam que o modo de viver em sociedade em que estamos não tem com a vida qualquer compromisso.