A Reforma Universitária de Córdoba de 1918, na Argentina – cujas raízes se encontram no liberalismo do final do século XIX -, pôs fim ao regime oligárquico que então governava a Universidade Nacional de Córdoba (UNC) e teve um impacto direto na democratização das universidades em toda a América Latina. Durante essa semana, iremos trabalhar com uma série de textos de resgate histórico desse processo, para que possamos nos inspirar naqueles que já lutaram por uma universidade emancipada.
Após a forte pressão estudantil, o interventor da Universidade de Córdoba, Matienzo, anunciou vacantes os cargos de reitor da universidade e de decanos das faculdades. Um novo sistema para eleição das autoridades foi implantado, de forma que todos os professores participassem e que os cargos não mais fossem vitalícios; uma das principais reivindicações do movimento reformista.
O dia 15 de junho de 1918 foi o dias das eleições, com integração dos professores na Assembleia Universitária, responsável por designar o reitor. O movimento estudantil pró-reforma possuía como candidato Enrique Martínez Paz, enquanto os setores tradicionais eram representados por Antonio Nores, membro de uma organização ultra conservadora da Argentina chamada Corda Frates.
Mesmo após duas rodadas de votação, nenhum dos dois candidatos obteve maioria absoluta. Na terceira votação, a maioria dos professores mudou seu voto, elegendo Nores para reitor, por 24 votos a 13.
Nesse momento, mais de mil estudantes esperavam do lado de fora pelo resultado. Com a vitória de Nores, os estudantes se sentiram traídos e invadiram pelas portas e janelas o salão onde ocorria a Assembleia, enfrentando os professores, o reitor, os policiais e seguranças. Os quadros dos bispos que haviam sido reitores desde 1613, representando um projeto elitista e conservador na história da universidade, foram derrubados. Um dos líderes do movimento, Emilio Biagosch, subiu ao palanque e escreveu no livro de ata:
“La asamblea de todos los estudiantes de la universidad de Córdoba declara la huelga general. Junio 15 de 1918”
Os mais de mil estudantes presentes, que representavam dois terços do total da universidade, assinaram abaixo do escrito na ata declarando a Greve Geral. Os edifícios da universidade foram tomados. Na fachada do Hospital de Clínicas, uma bandeira da FUC foi hasteada, momento registrado em foto que até hoje simboliza o movimento da Reforma Universitária de Córdoba.
A estátua de obispo Trejo, fundador da Universidade, foi derrubada. Os estudantes exigiam a renúncia do reitor Nores, o qual chamou a polícia que iniciou um confronto com os estudantes, que durou dias. Em 17 de junho, quando os estudantes, através dos representantes da FUC Ismael Bordabehere e Ismael Barros, anunciaram que não desistiriam, mesmo com repressão policial, de tomar a universidade e colocar para esta seu projeto, Noras disse que estava disposto a massacrá-los:
-— Nores: La fuerza nacional y la fuerza policial están dentro de la Universidad, y si debe masacrarse, que sea. Pueden quedar dentro de la Universidad para calmar los ánimos y tratar de que esto se arregle mansamente.
— Bordabehere y Barros: Nunca, doctor. Nos debemos a los que esperan afuera nuestra respuesta. Perder minutos es perder la vida de nuestros compañeros. La responsabilidad pesa sobre usted.
Nores ordenou que a polícia detesse os estudantes e os massacrasse, porém estes conseguiram fugir pelas janelas e se proteger pela multidão estudantil. No dia seguinte, a FUA declarou greve geral estudantil em todo o país, por quatro dias (19 a 22 de junho), em solidariedade às lutas dos estudantes de Córdoba e por repudiar a ameaça de massacre aos grevistas e a não renúncia de Nores.
Com o fim da greve, em 23 de junho, a FUA decidiu nacionalizar o movimento que ocorria em Córdoba e convocou o Primeiro Congresso Nacional dos Estudantes, para 14 de julho.