Lurdes se intoxicou com o uso de decapante, removedor de limpeza usado nos utensílios da cozinha do RU. O trabalho exigia proteção que não era efetivamente assegurada.
Com o desdobramento da pandemia, ela e outros trabalhadores terceirizados da Unicamp foram demitidos. Sem emprego e portadora de problemas respiratórios causados pelo emprego precário na Unicamp, Lurdes se tornou uma das vítimas fatais da crise brasileira após contrair o coronavírus.
Na mesma esteira da precarização, Edvânia Oliveira morreu por complicações da Covid-19 na mesma semana. Ela trabalhava no RU até o momento em que contraiu a doença.
O Restaurante da Unicamp continuou funcionando durante a pandemia, ainda que servindo a um número reduzido de estudantes.
Junto a Edvânia, outros três funcionários do RU testaram positivo para a doença. A reitoria, porém, alegou que com o rodízio na jornada de trabalho do RU, nenhum dos infectados trabalhou desde o dia 25 de fevereiro, insinuando que as contaminações não teriam relação com o local de trabalho.
Terceirização na Unicamp
As condições dos terceirizados têm piorado na Unicamp, assim como nas demais universidades do país. Na estadual de Campinas, a Funcamp demitiu trabalhadores da creche no começo da pandemia e, se utilizando da MP da Morte (MP 936), cortou salários de terceirizados.
A verdade é que as condições de trabalho dentro e fora da universidade tem se degradado com o desdobramento da crise econômica brasileira, que apenas se intensificou com a pandemia do coronavírus.
Nos últimos anos, o orçamento das universidades tem passado por cortes sistemáticos, implicando em demissões, redução de insumos para laboratórios e salas de aula, atrasando contas correntes, reduzindo a vigilância e manutenção da instituição, entre outros.
A degradação das condições de trabalho tem se expressado de maneira notória, no interior da universidade, com os trabalhadores terceirizados. E com os cortes orçamentários, a exploração destes últimos se intensificou ainda mais.
A terceirização, por si só, já permite uma remuneração salarial insuficiente para manter as mínimas condições físicas e morais.
Além disso, aumentou o número de demissões e, com isso, reduziu o número de trabalhadores por setor, pauperizando os trabalhadores demitidos, bem como os que se mantêm trabalhando, agora com trabalho redobrado.
Abaixo-assinado dos estudantes
Depois da morte das duas terceirizadas, estudantes da Unicamp se mobilizaram para construir um abaixo-assinado pedindo segurança sanitária.
O abaixo-assinado pauta (leia na íntegra no final da matéria):
– Responsabilização da empresa prestadora de serviço e da Unicamp pelo ocorrido;
– Prioridade de vacinação para as trabalhadoras terceirizadas;
– Testes semanais e disponibilização de equipamentos de proteção sanitária;
– Liberação das trabalhadoras que são grupo de risco, com licença remunerada;
– Assistência em dinheiro para a alimentação dos estudantes bolsistas.
Clique aqui para acessar o abaixo-assinado.
Estudantes também organizaram uma vaquinha virtual para arrecadar fundos para as famílias de Edvânia e Lurdes. A vaquinha, com meta de R$ 5 mil, arrecadou até o momento R$ 2.555,00 com 34 apoiadores.
Abaixo assinado por segurança sanitária para as terceirizadas e bolsistas da Unicamp (íntegra)
Na semana do dia 8 de Março, duas trabalhadoras terceirizadas da Unicamp foram vítimas da Covid-19. Lurdes foi uma das demitidas pela Funcamp na pandemia. Trabalhava na creche, que fechou, há anos, transferida após adquirir problemas respiratórios no Restaurante Universitário da Unicamp, segundo denúncias de outros trabalhadores.
Edvânia Oliveira, copeira no Restaurante Universitário da Unicamp, estava trabalhando presencialmente, em rodízios.
Na Unicamp, em mensagens que circulam entre trabalhadores, afirmam estar havendo um “surto de Covid” no restaurante. As mais afetadas são as trabalhadoras terceirizadas, contratadas pela Funcamp (Fundação privada da Unicamp), em sua maioria mulheres negras, que garantiram o funcionamento do bandejão durante toda a pandemia, com menos direitos e trabalhos precarizados.
Como os governos e as reitorias não estão garantindo testes massivos como método de identificação do vírus, e sim somente após a detecção dos sintomas, a reitoria de Marcelo Knobel busca se isentar de responsabilidade, enquanto as trabalhadoras se expõem, contaminam-se e morrem.
A garantia de alimentação aos estudantes bolsistas e aos trabalhadores da linha de frente do Hospital das Clínicas e CAISM, é uma demanda essencial na pandemia. Mas a forma como isso pode se dar, sem expor as trabalhadoras, mostra-se fundamental em um momento de agudização do aumento dos casos.
Por isso exigimos:
– Responsabilização tanto da empresa prestadora do serviço quanto da universidade pelo ocorrido, disponibilizando-se pelos fatos e agindo de forma a atenuá-los;
– Que todas as terceirizadas, tanto do bandejão quanto da limpeza e da segurança, tenham prioridade pela vacina;
– Que todas as terceirizadas sejam testadas semanalmente, que tenham acesso a todos os EPIs necessários (álcool em gel, máscaras), inclusive no deslocamento entre suas casas e a Unicamp;
– Que todas terceirizadas que são grupos de risco sejam liberadas com licença remunerada e que todos os direitos sejam garantidos a elas, com a certeza de que não haverá mais nenhuma demissão;
– Assistência em dinheiro para alimentação dos estudantes bolsistas. Que a reitoria ofereça um valor em dinheiro suficiente para todos os bolsistas, para que os estudantes não tenham que ir à universidade buscar as marmitas e, assim, diminuam sua exposição e a das trabalhadoras;
Lurdes e Edvânia presentes!
Os textos de opinião são de responsabilidade dos autores e não representam, necessariamente, as posições do Jornal.