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Opinião

O ataque na escola Thomazia e a brutalidade da realidade brasileira

Homenagem realizada em frente à escola após o ataque – Foto de Fernando Frazão/Agência Brasil
Por Maria Helena Vigo, redação do Universidade à Esquerda
29 de março, 2023 Atualizado: 09:29

Essa semana iniciou com um novo ataque em uma escola brasileira em mais um episódio de brutalidade que consternou o país. Na segunda-feira (27), um estudante de 13 anos atacou com uma faca professores e estudantes da EEB Thomazia Montoro, na Zona Oeste da cidade de São Paulo. A professora Elisabete Tenreiro, de 71 anos, esfaqueada pelas costas, veio a óbito, outros três professores e um estudante ficaram feridos. 

O ataque foi interrompido após uma professora de educação física imobilizar o adolescente.

Elisabete estava na escola há um ano, atuando na educação após sua aposentadoria e segundo os relatos de colegas e familiares era uma defensora da ciência e das lutas dos professores, muito querida por toda a escola.

Segundo relatos de estudantes, confirmados pela direção da escola, na semana anterior ao ataque o estudante havia entrado em conflito com outros colegas da escola e havia sido racista, chamando um colega de macaco. Elisabete teria sido quem interviu e apartou a briga.

O ataque na escola havia sido anunciado pelo estudante em uma conta privada no Twitter. A publicação teve curtidas e comentários de outros usuários da rede e a polícia vai investigá-los para apurar se estes o auxiliaram a realizar o ataque. Há também relatos de que o estudante teria anunciado para colegas que cometeria o ato.

Para a polícia, o adolescente afirmou que o ataque estava sendo planejado há tempos e que teria se inspirado no massacre ocorrido em Suzano (SP) e em Columbine, nos Estados Unidos. A escola anteriormente frequentada pelo autor do ataque havia feito um Boletim de Ocorrência contra ele, pois o mesmo estava fazendo publicações de vídeos portando armas de fogo e simulando ataques violentos. 

Após o ataque, novamente muito se fala em aumentar o policiamento nas escolas, contratar psicólogos para as escolas e na promoção de programas voltados a um “convívio saudável” e “cultura da paz”. O governo do estado de São Paulo tem propagado que encaminhou a contratação de 150 mil horas de trabalho de profissionais de psicologia na rede estadual por um ano.

Ainda, apenas no mês de março, a segurança pública paulista teria intervido para impedir outros três ataques em escolas no interior do estado.

A proliferação e aumento dos casos de massacres e ataques às escolas são um fenômeno muito característico dos Estados Unidos, que tem se difundido pelo Brasil nos últimos anos. 

Leia também: Os massacres brasileiros

A busca por produzir respostas, de explicar porque isso se escalou dessa forma e de como é possível evitar que a juventude tome atos como esses como uma saída diante dessa realidade acaba se direcionando para o interior das próprias escolas, em demandas de atuação da polícia e/ou dos campos da psicologia, saúde mental, e serviço social, com foco nos comportamentos dos indivíduos. Averigua-se o quanto o ataque estava prenunciado ou não e especula-se a possibilidade de identificar alunos com potencial para cometer esses ataques, em um contexto onde é quase semanal anúncios de massacres em paredes de escolas, redes sociais, ou mesmo, em comentários entre pares. 

O quanto a realidade brasileira e a degradação das condições de vida, trabalho e perspectiva de futuro para a juventude tem produzido toda essa brutalidade, têm produzido assassinos cada vez mais jovens, têm oferecido como saída a destruição do outro ou de iguais, é algo que aqueles que estão no âmbito do estado não podem colocar em debate, e é aí que principalmente a psicologia é elevada como uma forma de prevenção. Mas esse campo de conhecimento e atuação, mesmo em perspectivas críticas, tem um limite enorme diante do que são problemas estruturais.

Olhar para esse que é um sintoma americanizado, que tem se evidenciado na sociedade brasileira, significa poder olhar para o grau de dependência e da predominância do imperialismo sobre a vida da nossa classe, desde sua infância e juventude. Seja para o modo de ser adaptado e conformado diante de condições de trabalho e educação pauperizadas, seja para a violência disruptiva, em consonância com a máquina de moer gente que é o capitalismo brasileiro. 

Leia também: O ataque em Aracruz e a violência brutal direcionada para as escolas

É de uma dor enorme para familiares, amigos e para todos aqueles que se relacionam de alguma forma com escolas cotidianamente, a perda de mais uma professora em um ato de brutalidade dentro da própria escola, assim como a perda de um jovem, que acaba por escolher uma saída como esta para as contradições que permeiam a vida nesta sociedade.

Por isso, a questão não se encerra no sujeito que cometeu o ato, se tinha propensões a fazê-lo, se havia dado indícios, se há mais ou menos monitoramento por câmeras, policiais, psicólogos, assistentes sociais, e outros meios de “segurança”, ou na própria forma de convívio e socialização dos jovens dentro da escola. É necessário olhar com rigor para o que a dominação capitalista e a realidade do trabalho e da vida no Brasil hoje produzem, como esses ataques refletem a irracionalidade da forma de construção e organização dessa sociedade. As formas de analisar e apontar “saídas” diante desses dilemas não podem se restringir à mesma lógica e influência estadunidense que levam à reprodução e disseminação dos ataques em escolas. 

Os textos de opinião são de responsabilidade dos autores e não representam, necessariamente, as posições do Jornal.


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