Movimentos sociais lançam carta sobre Rechazo no Chile
Por Martim Campos, redação do Universidade à Esquerda
13 de setembro, 2022 Atualizado: 17:16
Dia 25 de outubro de 2020, a população chilena conseguiu uma vitória importante após massivos protestos no país: foi aprovado o fim da constituição instituída durante o governo ditatorial de Augusto Pinochet, um dos mais violentos regimes militares impostos ao continente latino americano. A aprovação pelo fim da constituição pinochetista chegou a quase 80%, com 78,27% dos votos, o “apruebo” à nova carta venceu os 21,73% do “rechazo”, que queria a manutenção da constituição vigente.
Após a submissão de uma proposta de nova Constituição para o plebiscito, no dia 04 de setembro a maior parte da população chilena aprovou o “rechazo” à nova constituição, com 61,86% dos votos contrário ao texto da nova Constituição, contra 38,14% em apoio a proposta elaborada pela Convenção Constitucional. É preciso analisar os elementos que levaram ao rechaço da nova constituinte e como se deu este processo ao longo dos meses. Nestes últimos três anos, o Chile foi um dos países latino-americanos com uma das maiores mobilizações de massas nos últimos tempos na América do Sul.
Após o Rechazo, uma declaração foi lida por Movimentos Sociais do Chile após o término da apuração. Confira abaixo na íntegra o texto, traduzido pelo Esquerda Online:
“Dirigimo-nos aos povos do Chile, neste momento em que confirmou-se que a opção pelo Rechazo foi majoritária neste plebiscito histórico. Queremos falar a cada uma das vizinhas e vizinhos, povos originários, movimentos e organizações de todos os cantos do país, que se mobilizaram para aprovar esta Constituição. A todas que entregaram seu tempo e energia nesta luta digna que temos travado, com a verdade como guia.
Para que o rechazo estivesse presente na consciência de nosso povo, bastava ligar uma TV ou abrir as redes sociais. Mas para conhecer o conteúdo da proposta constitucional, fazia falta uma companheira, uma companheiro, um militante, um ativista, um vizinho, ou uma vizinha informal, que pudesse desmontar as mentiras, que pudesse desmontar o esquema comunicacional articulado, financiado e organizado pela direita, o empresariado e os setores que administraram a precarização da vida, para impedir o avanço desse processo.
Isso nos coloca desde já uma tarefa. Não podemos não estar aí da próxima vez que nosso povo tenha que tomar uma decisão, temos que poder estar em todos os territórios.
Ainda que este resultado não tenha sido o esperado, é imprescindível esclarecer: trata-se de uma derrota eleitoral, mas não a derrota de um projeto. Perdemos em um cenário de profunda desigualdade. A desigualdade com a qual nos enfrentou os setores que ostentam o poder econômico e o monopólio dos meios de comunicação, e que com todos estes recursos, decidiram deflagrar uma campanha apoiada na mentira e no engano, em espalhar o medo em nosso povo e provocar o ódio racista e a competição do penúltimo contra o último.
Contudo, trata-se de uma derrota eleitoral da qual logo nos recuperaremos. Porque a opção do Rechazo não resolve nada. Nenhuma das necessidades e urgências, nenhum dos problemas sociais que geraram este processo encontra resposta neste resultado. Para responder a estes problemas sociais urgentes, o projeto da Nova Constituição será para os movimentos sociais um horizonte, porque garante um piso mínimo e irrenunciável de direitos e ferramentas e porque neste caminho que traçamos, não nos conformamos com menos.
A tarefa de pôr abaixo a Constituição de Pinochet e o modelo liberal segue na ordem do dia.
A vontade popular expressa no dia 25 de outubro de 2020 no plebiscito de entrada, aponta que os povos do Chile já decidimos acabar com a constituição de Pinochet através de um processo constituinte e um órgão eleito para cumprir essa tarefa. Não retrocederemos nessa vontade nem nos mínimos democráticos que definimos coletivamente: paridade, assentos reservados de povos originários e lista independentes que viabilizem uma participação popular inevitável para todo o processo futuro.
É indispensável que os setores que nós organizamos para possibilitar este processo assumamos também a tarefa que hoje nos fica encarregada. Já não há como voltar atrás. Nosso povo tomou uma decisão incontestável e a tarefa de pôr abaixo a Constituição de Pinochet e o modelo liberal segue na ordem do dia. Neste processo, o aprendizado que construímos será fundamental, porque os movimentos sociais já não somos o que éramos antes de escrever esta Constituição.
Neste processo o povo aprendeu a auto representar-se, isso não é algo dado, depois de décadas de exclusão dos setores populares da vida política, poder representar a nós mesmas é um trabalho do qual não iremos renunciar. O que temos aprendido neste processo será uma ferramenta fundamental para fortalecer a capacidade do movimento social, para fortalecer e representar as aspirações do povo.
Chegamos para ficar e, logo que passar o gosto ruim deste revés, em unidade seguiremos mobilizadas e mobilizados, fortalecendo o trabalho territorial e a regeneração do tecido social.
Porque não há forma de deter o rio quando ele encontra o seu curso.”
Você pode conferir também a declaração sendo lida abaixo.