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Escolas particulares negociam volta às aulas presenciais no Rio
Em meio do aprofundamento da crise sanitária, econômica e social em que vivemos atualmente no país, neste buraco sem fundo de perdas coletivas e individuais contínuos, as pressões por parte dos setores empresariais seguem firmes e insistentes em requisitar retomadas e tentativas de instaurar “novos normais”.
No âmbito da educação por exemplo, onde inicialmente vimos medidas rápidas para paralisar o ensino presencial nas instituições escolares e universitárias tanto nos setores públicos quanto particulares, em poucas semanas depois, o ensino remoto foi implementado pelo governo estadual.
Desde então, os planejamentos improvisados dos calendários de aula e metodologias duvidosas e extremamente burocráticas foram impostas pelo governo, sem garantias e preocupações de sequer construir essa retomada em conjunto. Pelo contrário: fez de maneira atropelada e destituída de qualquer garantia, pouco implicada em seus impactos, que acarretam atualmente em um esgotamento de professores que precisam lidar com uma carga de trabalho alta e poucos recursos para conseguir realizar seu trabalho, bem como os próprios estudantes que em 50% dos casos não possuem acesso à um computador com internet em suas casas, utilizando no máximo seus celulares. Com essa retomada de um ensino à distância precário e mal-planejado, permeado por orientações vacilantes que se alteram constantemente, o malabarismo feito por professores para tentar dar conta das demandas vindas do estado, pais e alunos, é feito com constantes assédios.
Agora, o próximo passo planejado por governantes de inúmeros estados do Brasil tais como o de Santa Catarina, Rio de Janeiro e São Paulo é o da volta presencial gradual nas instituições de ensino.
Nesta segunda-feira (29/06), foi realizada uma reunião entre empresários do setor, sindicato de professores e o prefeito Marcelo Crivella (Republicanos) sobre o retorno das aulas presenciais em escolas particulares do Rio de Janeiro. Não houve um acordo sobre a possibilidade de volta na reunião, pois enquanto os representantes do empresariado pressionaram o prefeito para a autorizar a reabertura de escolas particulares, o sindicato de docentes se posicionou contra o retorno devido ao alto nível de contágio. A proposta formulada pela prefeitura foi de um retorno “voluntário” dos docentes, onde os que se sentissem seguros para retomar as aulas presenciais o fizessem. O sindicato dos docentes se posicionou contra essa proposta, destacando o fato de que enfoca o peso das responsabilidades para os docentes que teriam que lidar com as possíveis retaliações caso não voltassem as aulas. Entretanto, já foi marcada para esta quinta-feira (02/06) uma nova reunião com o objetivo de voltar a debater se é possível ou não retomar as classes presenciais no próximo dia 15 de julho.
Mesmo sem um acordo, a prefeitura já adiantou protocolos para o retorno das aulas. Suas orientações gerais são voltadas para um retorno das classes presenciais de maneira gradual, mantendo as atividades remotas para controlar o número de alunos no ambiente escolar. As escolas também devem fazer uma escala para entrada e saída dos alunos, com o objetivo de não formar aglomeração, inclusive entre os pais dos estudantes. Dentro do protocolo consta também a necessidade do redimensionamento das salas de aula, para que se respeite o distanciamento social de, no mínimo, dois metros, ou o espaço de quatro metros quadrados por aluno. Isso deve ocorrer em todas as atividades educacionais presenciais.
Inevitável perguntar-se sobre a razão de um retorno presencial quando o município do Rio de Janeiro ocupa o primeiro lugar em quantidade de casos e mortes em relação a todo estado, mostra um claro compromisso com setores empresariais e não com a proteção da população, pois enquanto os estudantes permanecem em casa, também estão muitos de seus pais e cuidadores em tempo integral.
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O prefeito em seu pronunciamento contraditoriamente garantiu que as “equações continuam caindo”, bem como os números de óbitos e nível de ocupação dos hospitais – quando a taxa de ocupação para leitos de UTI destinados à atenção ao COVID 19 tem se mantido em patamares críticos, e segundo o Painel da Secretaria Municipal de Saúde, as taxas eram de 91% e 80%, respectivamente, ao final do dia 28/06/20.
Após a reunião na segunda-feira, a Fundação Oswaldo Cruz encaminhou à Comissão Permanente de Educação da Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro um documento sobre o risco de retorno às atividades escolares no Município do Rio de Janeiro, durante a pandemia da Covid-19. Elaborado pelo diretor da ENSP, Hermano Castro; e pelo pesquisador da Escola, André Perissè, o documento visa subsidiar autoridades públicas para a futura reabertura das escolas, que teriam a responsabilidade de estabelecer protocolos rígidos para monitoramento e controle de casos, atenção redobrada para os alunos especiais e política de abordagem psicossocial e saúde mental, de acordo com a instituição. Em suas recomendações com base nas sugestões da UNESCO, as diretrizes apontadas para um retorno seguro, sem a exposição desnecessária e com uma garantia da não exposição de crianças e adolescentes ao Covid-19, além de neste plano conter etapas pensadas em 3 momentos: antes de reabrir, o monitoramento durante abertura e a abertura com as possibilidades de retorno ao isolamento, tal retorno precisaria contar com a inclusão dos professores no planejamento do retorno, garantindo inclusive melhores condições de trabalho para estes e apoio para a adaptação das condições de ensino, bem como garantir a segurança dos alunos e de todos os trabalhadores da educação nos ambientes escolares.
Mesmo com a decisão da Prefeitura do Rio de adiar a retomada das aulas da rede municipal, os profissionais da educação continuam com questionamentos ainda não respondidos. O Sindicato Estadual dos Profissionais da Educação (Sepe) também se manifestou, defendendo que a categoria não volte para as salas de aula enquanto a pandemia não estiver controlada e se não houver uma reestruturação das escolas.
A coordenadora do sindicato, Izabel Costa, explicou alguns dos motivos, como escolas sem ventilação adequada, área de lazer, e até de água para lavar as mãos, além das turmas superlotadas e profissionais precarizados:
— Não vamos voltar só com água, sabão e máscara. Queremos saber quanto será investido em equipamentos de proteção individual e coletivo, treinamento e sanitização. Não vamos aceitar a resposta de que tudo será feito, sem um planejamento, além da fiscalização. São questões que deixamos muito claro e que sem esses requisitos nós não retornaremos. Se preciso, vamos à Justiça e faremos greve — argumentou.
Junto com outras 39 entidades de profissionais de educação, profissionais da área de saúde pública, assistência social e demais trabalhadores, movimento estudantil, responsáveis de alunos, entre outras, assinaram um documento de repúdio intitulado “Defender a vida na pandemia: por que não é hora de voltar” em relação à flexibilização das regras de combate à pandemia, incluindo a abertura precoce das escolas, creches e universidades, sem as condições de controle do Covid-19 estarem estabelecidas e os planos ainda pouco consistentes e estruturados.
A mobilização e elaboração do documento foi uma iniciativa do Sepe, por meio do Comitê Científico criado pela nossa Secretaria de Saúde e da diretoria do sindicato junto com outras entidades.
Neste documento, baseado nas diretrizes da Fiocruz é reiterado que o retorno presencial só seria possível com o compromisso de Prefeituras, governo do estado e União de apresentar concretamente o valor dos investimentos a serem realizados na retomada da educação no pós- pandemia, divulgando um orçamento e planejamento, para o atendimento das diversas exigências que surgem com a retomada. Assim, as exigências seriam do fornecimento não apenas de produtos de higiene e limpeza, mas também de Equipamentos de Proteção Individual e Proteção Coletiva, junto com uma redução significativa do número de estudantes por turma, observando rigorosamente as normas de distanciamento por metro quadrado e outras medidas de segurança nas escolas emitidas pela OMS e órgãos de saúde do Brasil. Para isso, seria fundamental a ampliação do quadro funcional de trabalhadores/as da Educação através de concurso público, incluindo professores, funcionários, psicólogos e assistentes sociais – efetivando a aplicação da Lei nº 13.935, de 11 de Dezembro de 2019, que dispõe sobre a prestação de serviços de psicologia e de serviço social nas redes públicas de educação básica.
O sindicato já se pronunciou que inclusive, caso a medida da retomada presencial passe neste momento, será realizada uma greve.
Além de tentar fazer acordo com a volta as aulas presenciais, um outro pronunciamento de Crivella que chamou a atenção foi o de que estariam sendo realizados uma testagem compulsória para as merendeiras das escolas.
“Eu estou dizendo a vocês, aqui, que não há data marcada para a volta da escola pública. Estamos testando as nossas merendeiras para verificar se já temos condições de reabrir nossos refeitórios. E claro, só vão voltar as crianças que desejarem. (…) Vinte mil crianças faziam refeições aos sábados nas escolas”.
Frente a essa medida, o sindicato publicou uma nota de repúdio, afirmando que o projeto de reabertura das unidades para oferecimento de merenda seria a ponta de lança para a reabertura total da rede municipal. Além disso, as merendeiras já sofrem com doenças do trabalho causadas pela sobrecarga de trabalho a que são submetidas, colocando esse grupo no de risco. Tal fator, aliado à continuidade da alta cadeia de transmissão da epidemia, expressa ainda mais o risco de trazer este grupo de profissionais para dentro das escolas antes que a pandemia seja controlada.
Tal descaso e parcos cuidados preventivos mostram que não há casualidades entre os pronunciamentos: está sendo desenhada uma política clara e catastrófica, que passa por cima das necessidades de nossa conjuntura atual, onde a realidade aceita é a do número de mortos. Este é o novo normal: as pressões escutadas serão a de um setor específico de empresários para retomar a economia e tentar diminuir efeitos de sua crise mesmo que deixem diversos adoecidos ou mortos.