Quando a reitoria da UFSC prorrogou por tempo indeterminado a volta às aulas na última sexta feira, o movimento Floripa Sustentável emitiu uma nota se defendendo das reações que recebeu da comunidade universitária e criticando a posição do reitor Ubaldo Balthazar.
“(…) em momento nenhum o Floripa Sustentável teve a intenção de ferir a soberania, a autonomia, o corpo docente, discente ou funcional da UFSC e, muito menos, de “ideologizar” esse episódio. No entanto, é preciso lembrar que a nossa Universidade Federal não nasceu de “geração espontânea” há quase 60 anos atrás. Foi a comunidade catarinense, até hoje mantenedora e financiadora da UFSC por meio dos seus impostos, que criou e desenvolveu essa Instituição – e entre esses criadores estão entidades que hoje fazem parte do Floripa Sustentável. À comunidade catarinense deve sim prestar contas a UFSC, porque Santa Catarina está acima de todos nós e, consequentemente, da comunidade acadêmica”, afirmam na nota.
Neste primeiro ponto, o movimento Floripa Sustentável faz confusão: é o porta voz dos interesses de alguns empresários, mas acredita ser um representante da comunidade catarinense.
O FloripAmanhã, coordenador do movimento, está longe de formular consensos universais sobre a cidade e de maneira alguma consegue esconder sua origem de classe. A associação é composta por sindicatos patronais, empresários e empresas catarinenses principalmente do ramo do turismo, do comércio e de serviços.
Seus esforços são canalizados para reunir as demandas dos distintos ramos empresariais e implementar seus projetos junto à Prefeitura de Florianópolis. Sendo os projetos, em sua maioria, prejudiciais para a vida dos trabalhadores, a associação também se empenha em sua auto-propaganda e na difusão da visão de mundo “empreendedora”, em vista de retirar os obstáculos de seus planos para a cidade.
A universidade é estratégica sob a perspectiva do FloripAmanhã pois atua, através de professores e laboratórios, como uma aliada moral e técnica para a implementação de seus projetos junto à Prefeitura. Dessa maneira, a pressão que estas organizações estão realizando, internamente e externamente à universidade, para a retomada às aulas pode ter relação com a necessidade de dar continuidade a essas atividades.
“A UFSC tem a Fundação Certi, que é uma unidade de desenvolvimento e tecnologia e inovação dentro da própria universidade. É inconcebível que apenas feche tudo e espere o tempo passar”, afirmou a coordenadora do Floripa Sustentável, Zena Becker.
No entanto, as notas e os textos de jornalistas locais vinculados à associação não apresentam apenas uma preocupação com a retomada das atividades, mas uma crítica aberta e direta à reitoria da UFSC e à autonomia universitária. Por que estão fazendo esta polarização com a reitoria da UFSC, em especial com a figura do reitor Ubaldo Balthazar?
Existe outro fim político à polêmica. O reitor Ubaldo não é um ator completamente vinculado às pautas do FloripAmanhã e do movimento Floripa Sustentável. Outros professores da UFSC, principalmente no CTC, representariam e dariam mais dinamicidade para a atuação destas empresas e para a readaptação da universidade em ao seu favor.
Dessa maneira, através da discussão sobre as aulas, se oportunizam de desgastar a figura individual do reitor e do Conselho Universitário, assim como se oportunizam para deslegitimar a autonomia universitária como um todo.
Diversas vezes, tanto na nota do movimento Floripa Sustentável quanto em colunas de jornalistas vinculados ao movimento, eles defendem que a universidade é “dissociada da sociedade” por conta da autonomia universitária. A confusão que fazem, contudo, está centrada em entender que a sociedade catarinense é composta exclusivamente pelas empresas de tecnologia e turismo de Florianópolis. Dessa maneira, a autonomia universitária realmente é uma pedra em seus sapatos! Ela torna mais difícil aos capitais subordinar aos seus interesses os conhecimentos produzidos na universidade.
Outro engano presente nas análises difundidas pela associação FloripAmanhã, que circula amplamente na UFSC e na reitoria, é o de transformar o debate sobre o ensino à distância em uma discussão apenas sobre as dificuldades tecnológicas dos estudantes.
As problemáticas do EàD, no entanto, não são somente técnicas, mas pedagógicas. A geração que ingressou neste ano na universidade estará marcada por um ensino de baixíssima qualidade. Além de ter que arcar com a discussão teórica isolados em casa, os estudantes de cursos com aulas práticas serão extremamente prejudicados. É impossível fazer aulas de desenho de arquitetura, aulas em laboratórios de química, aulas de campo ou aulas de cálculo em engenharia com a mesma qualidade à distância. Dessa maneira, tais decisões cabem apenas à comunidade universitária.
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