O Brasil registrou ontem (31/03) quase 3.950 mil mortes em apenas 24 horas. Ao todo, foram 321.886 óbitos desde o início da pandemia. O mês de março teve mais que o dobro de mortes se comparado ao 2 ̊ mês com mais mortes por Covid-19, que foi em julho de 2020. Em live realizada ontem, o pesquisador Atila Iamarino apontou para o catastrófico cenário que os brasileiros enfrentam sem perspectiva de melhora.
Sobre o quadro de vacinação, o pesquisador informou que atualmente receberam, pelo menos a primeira dose, um pouco menos do que 10% da população. Neste ritmo de vacinação, apenas em 2024 haverá um número razoável de brasileiros vacinados contra a Covid-19. O plano nacional de imunização, que atualmente tem permitido a vacinação sobretudo dos grupos de risco e profissionais de saúde, já revela uma desigualdade do país. Segundo dados compilados pela Folha de S. Paulo a partir de dados fornecidos pelo Ministério da Saúde, 38% das pessoas vacinadas são brancas, ao passo que apenas 21%, negras, ainda que estes últimos sejam a maioria da população brasileira. Esse índice expressa que, mesmo vacinando uma parte importante da população,as desigualdades ainda persistem.
Contudo, o direito à vacinação pode ser ainda mais restrito se persistirem as escolhas políticas em curso no país. Com a escassez de vacinas, atualmente há uma pressão do setor privado para a aquisição para usufruto próprio. Ontem, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) sancionou um projeto de lei que autoriza o setor privado, estados e municípios a comprarem vacinas contra a Covid-19.
Para Atila, a situação em que o país se encontra é fruto de diversas decisões políticas tomadas pela classe dirigente do país. A falta de vacinas hoje é resultado da recusa do Palácio do Planalto na compra de diversas vacinas ao longo da pandemia. Foram recusadas compras de Convax, Sputinik V e Covaxin. Para ele, o país vacina hoje apesar do Governo Federal. O pesquisador também ressalta que a compra privada não deve ser vista com otimismo, porque além de aumentar as desigualdades já averiguadas no plano nacional de imunização, essa política não se traduz em diminuição da mortalidade.
Além disso, ainda que a Butanvac esteja iniciando a fase de teste no Brasil, o resultado dessa vacina pode demorar ao menos seis meses. Sobre a Versamune, outra vacina que poderá realizar testes, há um complicador a mais enfrentado por conta da dependência tecnológica, já que para sua produção são necessários insumos que advêm do exterior.
Comparando com as estratégias de outros países, o biólogo ressalta a importância das vacinas como uma estratégia. Entretanto, salienta que ela, por si só, não freia a disseminação do vírus. O Chile, mesmo com quase ⅓ da população vacinada, tem apresentado crescimento significativo no número de casos. Outra questão a ser considerada é o risco de uma vacinação lenta, já que, quanto mais o vírus circula, mais chances existem de que novas mutações, mais resistentes, apareçam. O Uruguai, por exemplo, conseguiu manter a pandemia bastante controlada durante um longo período, até que uma variante brasileira, mais transmissível, chegou no país e causou uma subida inédita no número de casos.
Neste momento, o Brasil atravessa o pior momento da pandemia até agora e sem previsão de uma reversão deste quadro alarmante. Os números registrados são assustadores: 100 mil pessoas morrendo por mês. Isso, sem considerar as subnotificações. O pesquisador relembra que este cenário catastrófico não foi inesperado. O Ministério da Saúde havia previsto que haveria cerca de 3 mil mortes por dia no mês de março.
O colapso generalizado que estamos a atravessar traduz impactos profundos. A ausência de leitos de UTI nacional aumenta significativamente a taxa de mortalidade do vírus. Em São Paulo, onde há cerca de 1200 pessoas aguardando por um leito, 300 pessoas morreram na última segunda-feira (30/03) por não conseguirem uma vaga a tempo. Além disso, há falta de kits de intubação que, segundo o Conselho Nacional de Saúde, não foram comprados em agosto do ano passado. Ao invés, o Ministério da Saúde adquiriu o “Kit Covid” que, como se sabe amplamente, não possui eficácia para tratar da doença.
Para o pesquisador, “com a estratégia que adotamos agora, a Covid-10 não termina no Brasil”. Falta um plano coordenado que envolveria, além de uma intensificação na aplicação de vacinas, uma comunicação de risco eficiente; combate à propaganda contra a saúde pública; restrição social e auxílio emergencial maior; e distribuição de máscaras do tipo “Pff2” para toda a população. Sem medidas mais incisivas, o Brasil pode apresentar, até agosto deste ano, o dobro de óbitos. Atila finaliza esta live afirmando que “está ficando sem vocabulário para descrever o que está acontecendo aqui”.