Jornal socialista e independente

Lalo Minto

É professor da Faculdade de Educação da Unicamp. Pesquisador do Grupo de Estudos e Pesquisas Educação e Crítica Social (GEPECS). Autor de: A educação da miséria: particularidade capitalista e educação superior no Brasil e As Reformas do Ensino Superior no Brasil: o público e o privado em questão.

Produtivismo: o normal patológico da universidade no século XXI?

20 de novembro, 2020 Atualizado: 21:40

Os homens são levados, inconscientemente, a defender decisões e a lutar por soluções que concorrem para alimentar processos sociopáticos de desenvolvimento institucional. Isso […] sucedeu de forma particularmente intensa e nociva na esfera do ensino superior. Não se pode, sequer, dizer que “não houve tempo” para corrigir a “escola superior-problema”. (Florestan Fernandes, 1979, p. 59).

Tornou-se convencional celebrar quando instituições brasileiras (notadamente as universidades públicas) aparecem em rankings internacionais de desempenho. A cada vez que uma ou mais dessas instituições galgam posições nos ranqueamentos ou, ainda, quando se posicionam à frente de suas similares latino-americanas, um sem número de comentários positivos vêm a reafirmar sua relevância. Nem sequer setores do pensamento crítico, avessos ao neoliberalismo, às práticas eficientistas e à lógica competitiva, estão imunes a essa influência.

Um critério tem sido central nessa celebração: a qualidade dessas instituições teria como expressão a quantidade de publicações científicas. Matéria publicada em 2019 pelo jornal da maior instituição universitária pública brasileira, a USP, apresenta as instituições de pesquisa como “fábricas de conhecimento”. Curiosamente, nessa mesma matéria, que também celebrava os rankings e a posição daquela instituição como a maior de todas as “fábricas”, citava-se uma pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações que, após entrevistar quase 2 mil pessoas, constatou que apenas 13% delas souberam citar o nome de pelo menos uma instituição de pesquisa nacional.[1] Assim se manifestou o autor da matéria:

O estudo retrata um cenário preocupante, em que as universidades não são percebidas pela população como instituições de pesquisa, apesar de serem elas as responsáveis pela maior parte da produção científica nacional. (ESCOBAR, 2019).

Uso esse exemplo para mostrar que essas duas concepções – se não antagônicas, pelo menos contraditórias – têm convivido muito bem: o reconhecimento de que há uma dificuldade de percepção sobre a relevância social das universidades e instituições de pesquisa, por um lado, e a noção de que essa relevância estaria autorrevelada pela forma e quantidade dessa produção. E que, ademais, por meio das publicações científicas estaria garantido o benefício social mais amplo da “fábrica de conhecimento”.

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