Porta-vozes da OCDE, go home!
A coluna de Cláudia Costin publicada na Folha de S. Paulo, em 23 de julho de 2021, não nos surpreende pela acriticidade e a parcialidade no uso das palavras. Nela, a “educação integral” é abordada, todavia sem contextualizá-la nem tampouco problematizá-la.
As políticas educacionais de caráter neoliberal embaralham as palavras, entre elas os programas de escolas de tempo integral. Cabe, portanto, esclarecer o equívoco entre os termos empregados na coluna: educação integral não é sinônimo de ampliação do tempo de permanência na escola.
A educação integral pressupõe formação humanística, uma associação de formação intelectual, física e tecnológica – para seguir os preceitos marxistas – que pode, ou não, ser empregada em tempo integral.
Portanto, escola de tempo integral difere da dimensão da educação integral, perspectiva teórica que emerge do movimento operário europeu em meados do século XIX, orientada pelo rompimento com a alienação e pela promoção dos processos de conscientização. Logo, ela é diametralmente oposta às concepções sustentadas por padronização e mensuração dos conhecimentos, que, por princípio, desconsideram a apropriação desses e os transformam em atos mecânicos, direcionados ao preenchimento de testes em larga escala.
O tempo é aqui compreendido como uma construção social inscrita na sociedade pela articulação permanente entre a sobrevivência e a execução das tarefas. Assim, é possível (re) afirmar que o tempo se constitui em elemento decisivo na edificação da disciplina para o trabalho e, dessa maneira, resulta em estratégias de controle da classe trabalhadora.
Cabe esclarecer que a ampliação da jornada nas escolas não encontra consenso internacional e nacional, como apregoado na coluna e pode, inclusive, ser compreendido como um represamento da marginalidade em países com má distribuição de renda. Além disso, a autora da coluna não versa sobre o caráter excludente das escolas de tempo integral: quem são os e as estudantes nesse país – de crescente e vergonhosa desigualdade social – que podem permanecer sem trabalhar?
Claudia Costin enleva alguns estados que implementaram o tempo integral nas escolas como Pernambuco, Ceará, Paraíba, Goiás, Maranhão e São Paulo. Porém, cabe a ela indagar como isso está sendo ou será concretizado, uma vez que os referidos estados apresentam elevados índices de professores temporários, sobretudo o Espírito Santo que, segundo dados do INEP, na última década (2011-2020) teve, em média, 65% de docentes não concursados. Ou Ceará, campeão de contratos precários na Região Nordeste: 63% no mesmo período.
Ela poderia ter escolhido arrematar o texto a partir de vários aspectos, mas optou por responsabilizar os professores. Para ela, o novo desenho da escola os tornará mais motivados.
Professoras e professores motivados? Ora, isso sempre, mesmo com os baixos salários praticados, a falta de infraestrutura mínima para se trabalhar, de manutenção básica das escolas, inclusive às relativas à higiene. Esses renascem das cinzas diariamente e fazem a educação acontecer diante das mirabolantes políticas educacionais que muito exigem sem nada oferecer.
Sugere-se à colunista visitar as escolas, conversar com diretores de escola, supervisores de ensino, professores e famílias e aproximar-se mais da realidade antes de propalar as orientações da OCDE.
A OCDE (Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico), organismo internacional nascido na Europa e com 50 anos de existência, congrega 34 países na atualidade. No que diz respeito à educação, se dedica a elaborar relatórios sobre rendimento escolar, quantidade de dias letivos, carga horária e rendimento escolar entre países.
Tal organização muito contribuiria se versasse criticamente sobre os processos históricos que informam os contextos socioeconômicos, o investimento em educação, salário e condições de trabalho.
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