Arte, Opinião
A estética de um Governo
Estive a algum tempo conversando com alguns colegas de estudo sobre os usos do design e das mídias na ascensão e decadência de governos brasileiros. Sabemos historicamente que eles não parecem ser bonitos em suas questões gráficas, porém, os eixos estéticos fazem parte do contexto em que cada governo se propôs a ter. As cores vibrantes e diversas no slogan intermitente do governo Lula, com uma tipografia redonda, traz o aspecto de pluralidade. Já o de Bolsonaro se fazem presentes as cores da bandeira do Brasil com o sol voltado para a ascensão a direita, não à toa proveniente da tática de seus governos. Ambas aparecem de formas diferentes, e propõe populismos em diferentes esferas da sociedade. O primeiro como salvador da pobreza com propósitos assistencialistas, o outro como a solução para as crises que assolam o país.
Paremos, então, para analisar um pouco as táticas adquiridas pela direita para a eleição do seu candidato:
O uso das mídias como agitador/alienador de massas não é mistério. Duvido que já não tenha recebido uma corrente proveniente de Fake News – fato que leva a atual tática do Whatsapp de limitar o número de encaminhamentos de mensagem para 5 contatos. Mas o uso de frases de efeito e imagens tiradas de Baixa resolução fizeram com que a popularidade de Bolsonaro aumentasse, elevando-o rapidamente como uma possível solução às crises de forma mítica. O alto poder de atratividade aliado com um sentimento de pertencimento populacional que a tática trouxe foi, de fato, um dos fatores dominantes para eleição do Bolsonaro. Em uma concepção semiótica (ciência que estuda todos os sistemas de comunicação presentes na sociedade), essa “decadência estética”, presente na ênfase de campanha do governo, vem em um contexto sentimentalista e simplório, abrangendo exatamente a classe que quer atingir: evangélicos e classe média. Mesmo que a mensagem pareça vulgar, pertencem a uma cultura hegemônica e vem de uma pesquisa profissional de ênfase qualitativa aos processos de recebimento de informação.
O signo simplório é assimilado, na maioria das vezes de forma não-consciente, e geralmente, de forma apelativa. Na história estética esses signos são chamados de kitsch, que são objetos que possuem significados e aplicações controversas – provenientes de sinônimos como: vulgares, bregas (do inglês, cheesy), sentimentais e baratos. A cópia de referências eruditas sem algum critério atinge um nível crítico de popularização com as associações externas que seu público estabelece. São utilizados nas mais diversas esferas da sociedade, tendo ligação particular principalmente com ícones religiosos e na educação escolar (sim, aqueles desenhos feios dos livros didáticos e as representações de santos de forma eloquente tem um sentido para atingirem seu público).
Nesse caso o uso do escudo traz a ideia de proteção aliada a bandeira brasileira.
E essa estética só deu mais força para aqueles que não se sentiam representados pela estética pré-estabelecida como bela de alguns representantes da cultura. A arte não está obstante das relações de poder da sociedade em seus momentos históricos, hoje não é diferente. Rejeitar suas manifestações é se descolar dos anseios políticos que ela traz em suas diferentes esferas de classes. Ter que pagar minimamente 22 reais para ir ao cinema ou ao teatro, o preço absurdo taxado em livros e em outros segmentos de entretenimento e culturais é restringir o acesso e pautar a classe somente aos interesses que ao capital.
Já eleito, e com o lançamento do programa Future-se, se vê uma estética proveniente para um público diferente que o governo aspira em alcançar. O desenvolvimentismo através do empreendedorismo e inovação. A própria tipografia cortada estilo “techno” utilizada na logo estabelece (de forma nada sutil) o prestígio as áreas técnicas e tecnológicas – centros que hoje, recebem maior investimento privado nas universidades, em contrapartida aos centros humanos e artísticos que são irrelevantes aos olhos do setor privado (não à toa).
Apresentação do Programa Future-se.
Mas voltando às questões atuais de comunicação brasileira. Creio que é um erro indagável se afirmar nesse tipo de comunicação, pois cair nessa insuficiência superficial e sentimental da direita de produzir e propagar conteúdo, é em vez de se apropriar das práticas e de contextos históricos, assumir ela como mero instrumento alienante. Afirmar uma arte que de fato tire do conforto e seja combativa tanto quanto as pressuposições que vem das outras vias, diz que, mais que resistir fazer arte consciente torna-se uma forma de existir.
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