A Nova Lei do Gás, Projeto de Lei (PL) 4.476/2020 que altera o funcionamento do transporte, tratamento, processamento, estocagem, liquefação, regaseificação e comercialização do gás natural no país, foi aprovada na Câmara dos Deputados no dia 17 de março.
O projeto foi acordado na íntegra, conforme apresentado para os parlamentares pelo relator Laercio Oliveira (PP-SE). O texto seguirá, agora, para sanção presidencial.
O PL retornou à Câmara após alterações feitas no Senado no final de 2020, onde aprovaram o texto-base, mas adicionaram um destaque proposto pela senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA).
Segundo a página do Senado, a alteração dizia respeito à exclusão do artigo que poderia prejudicar a produção de energia limpa na região Nordeste — por indicar prioridade, em determinados leilões de energia, aos estados da região Amazônica, com as chamadas termelétricas inflexíveis, que geram energia de forma ininterrupta.
Com reações negativas à exclusão do artigo por representantes dos capitalistas da indústria, expressas pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), o projeto voltou para a Câmara e foi aprovado sem o destaque, na íntegra.
A Nova Lei do Gás foi apresentada no seminário da CNI do início do ano como uma das principais prioridades do setor, em conjunto com as reformas, tributária e administrativa, e a aprovação dos novos marcos: ferroviário e do setor elétrico.
O PL está em pauta há pelo menos quatro anos no Congresso Nacional, proposto também em 2013 pelo ex-deputado Mendes Thame, do PSDB/SP.
O que prevê a Nova Lei do Gás?
Segundo a cartilha do Ministério de Minas e Energia, “a nova lei do gás, ao ser aprovada em sua íntegra, irá consolidar a formação de um mercado aberto, dinâmico e competitivo”. A proposta define que a oferta de gás não é prestação de serviço público, não sendo obrigatório, portanto, o uso do regime de concessão, como ocorre atualmente.
As principais alterações propostas pela Nova Lei do Gás:
- O PL prevê mecanismos para tirar a concentração do mercado de gás da Petrobras, do qual a empresa participa, hoje, com 100% da importação e do processamento e com cerca de 80% da produção. Segundo notícia do site do Senado, a Petrobras vem se desfazendo de suas participações nas cadeias de transporte e distribuição após realizar o termo de compromisso com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade);
- A construção de gasodutos, de transporte do gás-natural, poderá ser feita através do regime de autorização, onde a empresa detém a infraestrutura construída autorizada pela ANP; em detrimento do sistema de concessão atual, em que o patrimônio, apesar do tempo de uso da empresa privada, permanece nacional após o fim do contrato de 30 anos;
- Permite que outras empresas acessem a infraestrutura já existente que pertence à Petrobras, também através do regime de autorização;
- As tarifas de transporte de gás natural serão propostas pelo transportador e aprovadas pela ANP;
- O texto estabelece possibilidades para revogar a autorização, caso a empresa declare falência, desrespeite o contrato, à pedido da empresa autorizada ou pelo descumprimento das obrigações, contratos e regulações;
- As empresas poderão receber autorização da ANP para fazer a estocagem subterrânea de gás natural em jazidas esgotadas de petróleo;
- Pela proposta, os serviços de transporte serão oferecidos pelo regime de contratação de capacidade por entrada e saída, com a permissão de uma ser contratada independentemente da outra;
- Fica a cargo da ANP a regulação do transporte, estabelecendo os critérios para classificação das instalações como integrantes do sistema; a formação de áreas de mercado de capacidade (determinada área do sistema nacional de transporte de gás, como um estado, por exemplo); os critérios para criação e atuação dos gestores dessas áreas (que poderão ser privados); e a padronização dos serviços de transporte conjunto pelas empresas que atuem numa mesma área de mercado de capacidade.
Segundo coluna do Allan Kenji para este jornal, o processo de redução do escopo da Petrobras, em curso desde o governo de Dilma Rousseff (2011-2016), foi continuado pelo governo Bolsonaro. Em dezembro de 2020 a empresa iniciou o processo de venda da Transportadora Brasileira Gasoduto Bolívia-Brasil S/A (TBG) e da Transportadora Sulbrasileira de Gás S.A. (TSB), compreendendo respectivamente participações de 51% e de 25%.
Em texto de uma representante do Sindipetro-RJ “Nova Lei do Gás privatiza e terceiriza o setor lesando o povo brasileiro”, publicado na página da Federação Nacional dos Petroleiros, a autora argumenta que:
“O PL tem por objetivo garantir a liberdade de preços e o estabelecimento do monopólio privado da distribuição e do transporte de gás em todo o território nacional. Ou seja, um navio poderá vir do exterior para vender aqui no Brasil sem ter compromisso com a instalação de novas infraestruturas de gás. E também inclui a quebra do monopólio dos estados na distribuição do gás natural, permitindo ainda sua exploração pelas concessionárias privadas de energia elétrica.”
Os petroleiros estão se posicionando contra o PL da Nova Lei do Gás, com a defesa de que este intensifica a perda de controle nacional sobre os setores estratégicos, no caminho da alta nos preços para os trabalhadores. Ainda, segundo o texto publicado na FNP:
“Os bolsonaristas estão chamando isso de “reindustrialização” do Brasil, mas todos sabemos que essas mudanças só beneficiarão os setores industrial e comercial, os investidores e o projeto de destruição completa do Brasil que está em curso neste governo. Resultado: o trabalhador vai pagar cada vez mais caro pelo botijão de gás!
Somente uma Petrobrás 100% estatal voltada para a produção do gás para o povo brasileiro poderá garantir a soberania do Brasil no setor.”
Os trabalhadores petroleiros estão há 25 dias em greve em diversos estados do país pela defesa do Sistema Petrobras e com o intuito de impedir o desmonte da Petrobras, que acarreta na alta dos preços da gasolina, diesel e do gás de cozinha.