Opinião
Quem pressiona pelo retorno às aulas
A busca pela normalidade recai sobre estudantes na volta presencial das aulas custando-lhes a vida
Com aproximadamente sete meses de isolamento social devido a pandemia, na falta de uma política rígida contra a propagação do vírus e na falta de perspectiva de uma resolução definitiva da situação pandêmica, intensificam-se as pressões para que a normalidade reine sob as ruas.
As escolas, as primeiras a terem decretado o fechamento são cobradas uma reabertura, mesmo em situação de contínua alta da contaminação.
Por parte dos proprietários e gestores de escolas privadas, especialmente através de seus sindicatos patronais, travam a batalha da reabertura, seja pelas vias judiciais, seja por pequenas mobilizações com cartazes e faixas nas ruas.
No final de julho, o Sindicato das Escolas Particulares (Sinepe) de diversos estados, como Rio de Janeiro e Santa Catarina, divulgou um vídeo afirmando que as escolas particulares deveriam voltar às aulas presenciais pois, para o sindicato patronal, “confinar é desconhecer, ignorar, subtrair vida, é fragilizar, debilitar, mexer com o emocional”. A repercussão do vídeo acabou sendo bastante negativa, recebendo duras críticas por autoridades de saúde à mídia.
A despeito da má repercussão na época, as empresas e seus sindicatos patronais não cederam e continuam buscando a retomada presencial, pressionando prefeitos e governadores em todo o país.
Tamanha persistência rendeu os frutos que queriam: em Manaus, a primeira cidade a colapsar mediante o coronavírus, também foi a primeira a permitir o retorno das escolas privadas, desencadeando o processo de retomada em outros estados, como no Maranhão, Rio de Janeiro e São Paulo. Apesar da pressão empresarial para a retomada das aulas presencial, os pais e responsáveis reprovam a medida e continuam cancelando as matrículas das crianças menores.
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No caso das escolas privadas é mais evidente a pressão pelo retorno presencial, entretanto, nas escolas públicas a pressão recai tão forte quanto.
Com a paralisação das escolas, as demandas com os cuidados dos filhos aumentou para pais e mães, mais ainda quando fala-se de crianças pequenas que não podem ficar sem a supervisão de um adulto.
A adoção do ensino remoto também colocou novos problemas nas casas, pois agora as atividades escolares muitas vezes precisam de algum acompanhamento ou precisam ser buscadas nas escolas (nos casos onde a família não possui os meios de fazer virtualmente).
Essas questões aparecem para os demais setores da burguesia como algo a ser combatido, de forma que os trabalhadores possam estar menos ocupados com suas famílias, mais ocupados com o trabalho a ser realizado e com maior disponibilidade de horários.
É sobre esses aspectos que organizações das mais variadas vêm se debruçando a fins de coletar dados e redigir pareceres em defesa da volta às aulas presenciais.
São organizações como o Conselho Nacional da Educação (CNE) e o movimento Todos Pela Educação (TPE), bem como organizações internacionais tais quais o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), que atuam hoje em prol da retomada presencial das aulas, em especial nas escolas públicas.
Um exemplo desse tipo de atuação é a campanha internacional para a reabertura das escola promovida pela Unicef, Save our future, que apresenta na página inicial de seu site a seguinte declaração:
“A pandemia da COVID-19 interrompeu a educação de mais de 90% dos estudantes do mundo, exacerbou desigualdades já existentes e acirrou a crise global de aprendizagem. O futuro de toda uma geração está em risco.”
Essas organizações, que antes pressionavam pela adoção do ensino remoto, agora defendem que o retorno presencial seria fator de proteção a crianças e adolescentes. Sobre isso, argumentam que o fechamento prolongado das escolas aumentam desde a evasão a riscos de violência, de imunização e alimentação a saúde mental, conforme apresentou a Unicef em seu documento “Recomendações para a reabertura de escolas”.
Com pesquisas de opinião pública, tais organizações constroem políticas a serem levadas adiante através dos poderes legislativo e executivo. Nas grandes empresas de mídias que controlam hoje os meios de comunicação, essas organizações atuam hoje para mudar a opinião pública sobre a retomada presencial das aulas.
Diversas matérias são veiculadas sobre a opinião desses que estão nos mais altos cargos de tais organizações, servindo para embasar ou ilustrar relatos e entrevistas que os jornais e revistas coletam de pessoas comuns, como donas de casa, trabalhadores autônomos, etc. Buscam abordar nessas matérias sobre assuntos como quanto seus filhos têm sofrido por estarem isolados e como a rotina se tornou mais estressante. Assim, efetivam a pressão política nos governantes do âmbito municipal ao federal enquanto convencem a população de que o isolamento não é mais seguro.
Entretanto, não é um papel passivo que assumem governadores, prefeitos e o próprio presidente e suas equipes. Seus comprometimentos com as frações burguesas precisam estar mais ou menos alinhados para garantir a manutenção do poder. Dessa forma, a decisão dos diversos estados que retornaram às aulas presenciais não é meramente uma concessão, mas também parte do projeto político que os elegeu.
Parte dessas frações hoje notoriamente defendem a retomada presencial sob diversos pretextos, contudo, é preciso analisar com cautela os reais interesses por trás por trás de tais defesas antes de assumi-las como uma preocupação desses sujeitos com a educação das crianças e adolescentes.
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