Um cenário de trégua tem se apresentado nas principais tensões entre os representantes dos interesses das classes dominantes na política nacional. Bolsonaro, STF e Congresso, que nos últimos meses vem medindo forças entre ameaças de golpe e de descontinuidade do governo, parecem ter freado os ânimos na queda de braço vigente no país.
É preciso levar em consideração que uma série de elementos parece ter desbancado as condições de Bolsonaro levar sua empreitada golpista adiante, pelo menos nesse momento: perdas de alguns de seus principais ministros em setores como justiça, saúde e educação; operações policiais em torno do inquérito das fake news, com investigação e prisões preventivas de figuras como Sara Winter e outros responsáveis pelas redes de agitação da base Bolsonarista; e a prisão de Queiroz, investigado por esquemas de rachadinha nos gabinetes parlamentares dos filhos do presidente. Entretanto, não se trata apenas disso.
O movimento de aproximação do governo Bolsonaro dos parlamentares do centrão permitiu o retorno da agenda de reformas para o centro das atenções do congresso. O esfriamento das tensões entre o três poderes está expressa também na necessidade de viabilizar os anseios das classes dominante frente ao agravamento da crise econômica. Esse movimento era necessário nesse momento, tendo em vista que o que resta do fundo público está se esgotando para conter os impactos mais imediatos da crise que tem vindo a tona. Além disso, a aproximação das eleições municipais pode inviabilizar a disposição para aprovação de projetos impopulares daqui a alguns meses.
Ainda que tanto esses setores, quanto Bolsonaro, saibam que esta agenda não tem como conter a forma devastadora que a crise econômica está tomando, não é isso que importa. O que importa é que no fim das contas os maiores custos da crise sejam transferidos para as costas dos trabalhadores. Não é a toa que o patrimônio dos bilionários do país segue crescendo em meio a pandemia, enquanto o restante do país passa uma série de perrengues para acessar míseros R$600,00 do auxílio emergencial.
Assim, embora tenham projetos diferentes de promoção de si mesmos no poder, tanto os representantes do congresso, quanto Bolsonaro, precisam prestar contas para quem verdadeiramente administra o país. Nisto que é o central, sem sombra de dúvidas estas figuras estarão de mãos dadas.
Paulo Guedes está desde o início de Julho atuando para retomar as privatizações e aprovar a reforma tributária até a metade de Agosto, além de buscar concluir os projetos Renda Brasil e a carteira verde-amarela. Enquanto isso, Rodrigo Maia já vêm fazendo articulações para que a reforma administrativa também entre na fila e seja aprovada ainda este ano.
Ainda que apresentada de forma fatiada, a reforma tributária levará a mudanças significativas no recolhimento de tributos, inclusive com perdas de arrecadação, com propostas como a desoneração de folhas de pagamento. E é por isto também que a reforma administrativa precisará vir logo em seguida. Ao invés de taxar grandes fortunas, ou cortar das classes realmente privilegiadas do serviço público, como o alto escalão do judiciário, o governo irá atacar o conjunto do serviço público. Afinal, isto também lhe permitirá atribuir aos servidores públicos que tentarem resistir a esses ataques a responsabilidade pelos problemas econômicos do país.
No fim das contas, o recuo adotado por Bolsonaro, pode lhe viabilizar um fortalecimento para os próximos episódios de sua empreitada golpista, tanto com a possibilidade de resgatar confiança de frações das classes dominantes, tanto com uma maior divisão e desgaste da classe trabalhadora em busca de sobreviver aos efeitos deletérios da crise.
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