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Coletivo Emancipação Socialista (CESO)

O CESO é uma coletivo político que tem por objetivo servir a luta da classe trabalhadora pela revolução brasileira. Busca contribuir com a ampliação da capacidade organizativa da classe e também com os instrumentos UFSC à Esquerda, Universidade à Esquerda e Escola da Classe Trabalhadora – Vânia Bambirra. Mais informações no site do Coletivo.

Muito além de “atos antidemocráticos” e “crimes”: nota do Coletivo Emancipação Socialista (CESO) sobre a escalada golpista do dia 8 de janeiro

09 de janeiro, 2023 14:17


A invasão dos prédios da esplanada dos três poderes no último domingo, 8 de janeiro, foi um episódio funesto da crise nacional. A classe dominante brasileira rapidamente ocupou os jornais e noticiários na tentativa torpe de separar com esforços cirúrgico-ideológicos o “joio do trigo”: tratam os perpetradores do atentado golpista como “punhado de imbecis criminosos”, tacanhos que “não dispõe de respaldo político”, “celerados”, “punhado de idiotas”, “​​malta de bolsonaristas”, “amalucados”, um punhado de “terroristas”. Enquanto a esquerda apressou-se em defesa das “liberdades democráticas”, das “instituições da democracia”, “no repúdio aos ataques às instituições da República”, da “soberania do voto popular” e da “segurança do Presidente Lula”.

Para o CESO, os atos devem ser qualificados como um passo a mais no processo do golpe. Todos os elementos de cenário indicam na direção de que se trata de uma ação estrategicamente planejada e orientada para provocar o acirramento e o teste de forças sociais, além de polarizar e agudizar a desobediência militar dos setores de base das polícias e das forças armadas. Nesta direção, a preparação dos atos no aniversário de dois anos da invasão trumpista ao Congresso Nacional dos Estados Unidos, não deve ser subestimada. Tampouco, as distensões ocorridas nos quartéis das polícias militares estaduais, no Gabinete de Segurança Institucional (GSI) e nos estratos militares.

A responsabilidade do governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB) é patente, bem como do ex-ministro de Jair Bolsonaro, Anderson Torres. Ibaneis é o mesmo governador que, no duro 7 de setembro de 2021, diante das ameaças golpistas de Bolsonaro, deixou Brasília desguarnecida. Esperançoso e conciliador com os interesses de sua base bolsonarista, diante da ameaça de que os prédios da esplanada pudessem ser invadidos naquela ocasião, só retornou à Brasília quando foi informado de que o golpismo fora desmobilizado nos bastidores – com o patético protagonismo de ninguém menos que Michel Temer. Tal episódio passou quase despercebido pelo ensejo de direcionar as atenções aos superpoderes de Alexandre de Moraes e às eleições. Tratava-se, no entanto, de um ensaio da maior gravidade. Que Ibaneis Rocha tenha sido afastado do cargo por decisão exarada pelo Ministro Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e não pelo decreto de intervenção federal do Presidente Lula, é uma concessão inaceitável, sintomatologia dos acordos de bastidores que apenas fortalece as aspirações radicais dos bolsonaristas.

Há mais, porém. É preciso apurar até as últimas consequências as razões pelas quais a segurança da esplanada ficou relegada à Polícia Militar do Distrito Federal. Visto que a responsabilidade institucional pela segurança da Presidência da República é do Gabinete de Segurança Institucional (GSI); o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Congresso Nacional dispõe de suas próprias polícias; a Agência Brasileira de Inteligência (ABIN) tem a incumbência de monitorar precisamente este tipo de levante. Em condições normais, o presidente Lula jamais estaria em Araraquara (SP) por razões tão singelas, pois a ABIN teria informado o Presidente da possibilidade iminente de invasão do setor presidencial e lhe aconselhado a retirar-se da capital federal. Por fim, há que se levar em conta que Brasília foi planejada para que o Comando Militar do Planalto pudesse, a qualquer tempo, monitorar mobilizações sociais na Esplanada e responder em pouco mais de cinco minutos, qualquer ameaça à ordem. A classe trabalhadora conhece bem o peso estratégico-militar do desenho final da esplanada no projeto de construção da nova capital federal, visto que o alvo sempre foi a esquerda revolucionária. Por tal razão, a menos de dez quilômetros do Palácio do Planalto estão estacionadas nada menos que cinco unidades militares: o Batalhão de Guardas Presidencial, o Batalhão de Polícia do Exército, o Regimento de Cavalaria de Guardas, o Grupo de Artilharia e o Esquadrão de Cavalaria do Exército. Isto, sem falar do destacamento de defesa aérea de Brasília que cumpre tarefa destacada de defesa antiaérea e de monitoramento de inteligência, dado o risco que a capital federal possui por concentrar parte do centro decisório nacional. O Ministério da Defesa do Governo Lula, chegou a informar em resposta as públicas e notórias mobilizações bolsonaristas que dispunha de 2,5 mil homens mobilizados para garantir a segurança da Esplanada.

Portanto, a situação é grave e exige máxima cautela, mobilização de massas e preparo da esquerda para defender os interesses de sua classe neste cenário. É preciso que a esquerda revolucionária previna-se de assumir uma posição institucionalista e de defesa republicana que termine por educar a classe trabalhadora no sentido de que a única luta possível e legítima é aquela que ocorre nos bastidores purulentos da vida política nacional por via das instituições e dos acordos de bastidores entre o patronato, partidos, governos, centrais sindicais, movimentos sociais e frentes populares. O CESO defende intransigente a célere, enérgica e exemplar punição de todos os envolvidos dentro e fora das camadas militares, dos movimentos bolsonaristas, empresários financiadores e, inclusive, a perda dos cargos públicos e mandatos dos servidores públicos partícipes; e a perda dos mandatos dos deputados e senadores de direita, recém eleitos ou reeleitos, que convocaram e apoiaram tais acontecimentos. Não pode haver seletividade, como se o golpismo estivesse limitado a “um punhado de extremistas”, é preciso sanear a vida nacional e extirpar pelas raízes o golpismo de direita. Se o Governo Lula-Alckmin tem disposição em realizar tal tarefa histórica, veremos. Causas e razões não faltam: os golpistas ofereceram sucessivas mostras de que estão dispostos a seguir provocando terror, mobilização e insubordinação armada.

O verdadeiro combate ao intento fascismo não se faz meramente dobrando a aposta no “funcionamento das instituições do Estado”, mas no aumento da capacidade de organização independente da classe trabalhadora em suas lutas. Como a base da organização dos trabalhadores depende da recomposição de suas condições de vida, trabalho e luta, não há alternativa senão exigir intransigentemente a revogação das reformas anti-trabalhistas. Somente daí, na luta concreta, a intentona fascista poderá ser vencida em sua “forma bolsonarista” e, o mais importante, em sua própria razão de ser. É fundamental e urgente revogar a reforma trabalhista, a reforma da previdência, impedir a reforma administrativa e tributária!

Portanto, há uma agenda para a esquerda revolucionária que pode colocá-la na disputa pela vanguarda diante da classe trabalhadora neste cenário. Posição que situa-se entre a sua capacidade de defender a rigorosa punição aos golpistas de direita – que não desejam apenas derrubar o governo eleito Lula-Alckmin, mas impor um regime de revanchismo de classe – sem, com isso, ceder à posição de atrelar-se por completo à defesa abstrata de “liberdades democráticas”, da “República”, da “soberania do voto”. Ou teríamos esquecido, justamente nós, que todo o sistema democrático-liberal brasileiro foi desenhado com perfeição para impedir o ascenso de partidos radicais dos trabalhadores? Teríamos rendido nossas consciências ao fato óbvio e inescapável de que por detrás da abstração republicana o que há são as instituições de repressão ao poder popular?

A invasão golpista na Esplanada não deixa espaço para dúvidas e vacilações: o governo não pode se esquivar de agir energicamente na punição aos milhares, dentro e fora do aparato do Estado, sem com isso definhar suas parcas energias. Exigir tal posição intransigente é tarefa da esquerda revolucionária, mas atrelar-se acriticamente à defesa do Estado e do próprio governo em razão de inimigo comum, jamais! Qualquer que seja o destino do atual governo de conciliação, será menos pior sempre que houver disposição independente da classe trabalhadora em caminhar energicamente em razão de suas necessidades históricas, sem transigir por medo ou insegurança.

Vamos às ruas! Vamos às lutas!

Brasil, 9 de janeiro de 2023

Coletivo Emancipação Socialista (CESO)


A nota política do CESO também pode ser acessada no site da organização.

As opiniões expressas nas colunas são de responsabilidade dos autores e não representam, necessariamente, as posições do Jornal.

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